O Laboratório Nacional de Astrofísica
(LNA/CNPq)
opera o Observatório do Pico dos Dias (1860 m), situado entre os municípios de
Brasópolis e Piranguçu, no sul de Minas. Trata-se do maior conjunto de equipamentos
astronômicos no Brasil e serve a toda a comunidade científica na área.
Selecionado após exaustiva escolha de sítio, em que se pesou sobretudo as condições
climáticas, normalmente adversas às observações astronômicas no nosso clima tropical,
é o único local que os pesquisadores do País possuem para fazer Astronomia de forma
competitiva internacionalmente. No Brasil não deve existir sítio de qualidade
significativamente superior, e os custos de uma eventual mudança de local são proibitivos.
Assim, só nos resta manter este sítio em condições adequadas.
Entretanto, um perigo ronda o Pico dos Dias, através de uma forma não muito perceptível
de poluição para o público em geral - a poluição luminosa. O clarão urbano está roubando
a visão do céu noturno. Nas cidades as pessoas não mais podem contemplar as belezas dos
céus, e o recente "fracasso" do cometa Halley foi em grande parte devido a isso.
Mas os astrônomos profissionais estão ameaçados pelo mesmo problema que, curiosamente,
possui soluções simples e na direção das necessidades brasileiras para minimizá-lo.
De fato, o nosso problema energético vem, em grande parte, do desperdício de energia pelo
seu uso inadequado. E uma das formas de desperdício está na escolha da iluminação das
cidades. O clarão que se vê ao se aproximar de uma cidade é uma demonstração simples de
que a luz que deveria estar sendo usada para iluminá-la está realmente sendo usada na
direção contrária.
A solução está no uso adequado da iluminação através da escolha das lâmpadas e das
luminárias. As lâmpadas poderiam ser classificadas, conforme sua emissão, em contínuas e
discretas. As contínuas emitem todo o espectro luminoso, do infravermelho ao ultravioleta
(como as lâmpadas incandescentes) e as discretas em apenas algumas linhas das cores (como
as de mercúrio, sódio a alta pressão e sódio a baixa pressão). Na verdade, as lâmpadas de
mercúrio e sódio a alta pressão também emitem, parcialmente, de forma contínua. De outra
forma, podem ser classificadas pela sua eficiência luminosa, ou seja, pela quantidade de
luz que estão emitindo. Uma maneira de se medir é verificar quantos "lumens" emitem por
watt de energia. A tabela abaixo mostra essa quantidade para alguns casos:
Tipo Lumens/Watt
Incandescente 20
Mercúrio 54
Sódio a alta pressão 125
Sódio a baixa pressão 183
É evidente que, descontado o preço de instalação, a lâmpada de sódio a baixa pressão é a
mais econômica em termos de energia consumida, e a mais eficiente, produzindo luz amarela,
de agrado do público em geral.
Qual seria a classificação sobre os efeitos para um observatório? Para a maior parte das
observações é interessante aquela que produzir menor efeito sobre a maior parte do
espectro luminoso. Ora, é justamente o caso da lâmpada de sódio a baixa pressão.
Infelizmente não é essa lâmpada que está sendo usada para iluminar as cidades em torno
do Pico dos Dias. Pior ainda, após o uso intensivo das lâmpadas de mercúrio, muito nocivas,
começam a ser instaladas, pelas prefeituras locais, lâmpadas de sódio a alta pressão,
também nocivas, mas cujo efeito somado ao das lâmpadas de mercúrio provoca uma poluição
luminosa mais forte.
Uma atitude imediata de proteção ao Pico dos Dias deveria ser a manutenção das lâmpadas
de mercúrio, por já existentes, até ser possível sua substituição por lâmpadas de sódio
a baixa pressão.
As luminárias dos postes devem ser escolhidas de forma a só enviar luz na direção abaixo
da horizontal, ou seja, onde efetivamente se quer iluminar - as ruas. Existem vários
modelos possíveis, mas não são esses os que são normalmente usados. É, aliás, comum se
ver praças com luminárias extremamente inadequadas para o efeito de iluminação, mas que
são instaladas porque parecem bonitas durante o dia, com globos direcionados para cima.
Quando do alto de uma montanha como o Pico dos Dias, ou de um avião, vemos diretamente
as lâmpadas das cidades, podemos perceber como as lanternas não estão cumprindo sua
função de direcionar a iluminação.
A atitude aqui deve ser a de instalar luminárias novas que não emitam acima da linha do
horizonte e, gradativamente, substituir os modelos antigos. Outras atitudes podem ajudar:
A pavimentação das ruas das cidades deveria ser de asfalto, diminuindo a reflexão;
O máximo de arborização possível;
Instalação de "timers" para cortar a iluminação onde ela não é necessária na segunda
metade da noite (iluminação de parques, campos esportivos, etc.);
Evitar iluminar fachadas de edifícios e monumentos nas cidades vizinhas ao Pico dos Dias.
A poluição luminosa artificial no Pico dos Dias é atualmente igual à produzida por efeitos
naturais, havendo, portanto, o dobro de luz do que o mínimo possível, e aumentando numa
taxa alarmante. As iniciativas que evitariam essa situação, adotadas nas vizinhanças de
observatórios do Primeiro Mundo, são, em geral, as mesmas que viriam do uso racional
de energia. As projeções mostram que o sistema energético brasileiro entrará em colapso
em dois anos sem novas hidroelétricas, impossíveis de se construir em tão pouco prazo,
abrindo caminho para a necessidade urgente de se procurar soluções que evitem o
desperdício energético. Por que não começar onde existe sua necessidade, para
salvar o Pico dos Dias?
APÊNDICE 1
Cidades mineiras que devem estar priorizadas nas iniciativas de proteção contra a poluição
luminosa: