Finalmente, após dez anos de meu engajamento na luta pela preservação da visibilidade do céu noturno para as futuras gerações, através de uma sofrida campanha contra a poluição luminosa e seu imenso desperdício de energia elétrica e de dinheiro público, vejo algumas ações positivas tomando rumo em Uberlândia.
Na época em que comecei a criticar a iluminação dispersiva, fui tratado de um modo lastimável, difícil de suportar, porque estava sozinho e defendia uma idéia que aqui era nova. Por isso, tive de lidar com pessoas que, sem sequer lerem as minhas propostas, supunham que eu estivesse sugerindo a escuridão das nossas ruas pelo desligamento de todas as lâmpadas da cidade. Outras, menos sutis, deixaram explícitas publicamente as suas dúvidas quanto à minha sanidade mental, sem falar nas que disseram que eu deveria ir morar no mato, bem longe do inevitável "progresso". A mídia, que poderia me ajudar a educar o povo, me usou para fazer propaganda das lâmpadas amarelas, como se elas fossem a solução para as minhas justas reclamações.
Com o passar do tempo, algumas pessoas sensíveis e inteligentes começaram a perceber a lógica do erro que eu apontava, que está no fato simples de que grande parte da luz artificial noturna gerada é enviada diretamente para cima, sem iluminar as ruas. E é esse fluxo inútil que causa sérios problemas ambientais, além de nos roubar a beleza do céu noturno estrelado, o que mais me afeta diretamente, porque tenho as atividades relacionadas à Astronomia como meu projeto de vida.
Após a construção do meu observatório astronômico e sua imediata abertura para visitas da comunidade, principalmente das escolas, um número bem maior de interessados ficou sabendo dos problemas causados pela iluminação irresponsável, agravada justamente pelo uso das novas lâmpadas a vapor de sódio, amarelas. Após mais alguns anos de campanha, como a união faz mesmo a força, meu trabalho científico e educacional acabou por ser citado de um modo correto no meio político atual, que demonstrou interesse em colaborar.
Logo no início da administração do novo prefeito, Dr. Zaire Rezende, fui chamado para uma reunião na Secretaria Municipal de Ciência e Tecnologia, na qual o secretário Mauro Burjaili, de imediato, criou duas comissões, sendo uma para resolver o problema da poluição luminosa e outra para tratar especificamente do desenvolvimento da Astronomia em Uberlândia. Da primeira surgiram soluções que já estão em fase de execução, como a instalação obrigatória de luminárias corretas nos postes onde for feita a troca de lâmpadas de mercúrio por lâmpadas de sódio, para reduzir a dispersão. Da segunda nasceu o projeto do Espaço da Ciência, que resultará na construção de um museu interativo e um observatório astronômico municipal dentro do Parque do Sabiá, com verba inicial já garantida. Portanto, pode-se notar a diferença nos resultados quando uma prefeitura tem por princípio dar atenção aos cidadãos.
Hoje, quando a República Tcheca já aprovou uma lei federal contra a poluição luminosa e esse assunto explode nas TVs mundiais, na Internet e nas revistas técnicas e científicas populares, fico pensando no tempo perdido, nas oportunidades não aproveitadas e na degradação ambiental promovida aqui na última década. É uma pena, porque poderíamos ter sido modelo para o mundo, como eu disse no início da campanha. Mas, como foi sempre muito forte a crença de que santo de casa não faz milagre e de que povo é útil apenas nos dias de eleições, aqui estamos, com dez anos de atraso, vendo todo o Planeta acordar para um problema, apontado como novo, mas que já era conhecido em nossa cidade há muito tempo e que somente agora começa a ser parcialmente resolvido.
As pessoas precisam entender que estamos utilizando a iluminação noturna de um modo errado e que a quantidade de luz desperdiçada, somente em Uberlândia, pagaria com folga o custo da construção de um observatório astronômico por mês. Vendo-se esse péssimo exemplo de desperdício, torna-se importante, entre outras coisas, meditarmos sobre a moralidade de um racionamento de energia imposto a todos, sob ameaças de punição, como se fôssemos culpados, porque, para mim, ele soa exatamente como o famoso "faça o que eu digo mas não faça o que eu faço". É um absurdo que poucos conseguem perceber.
Enfim, o momento presente é especial. Vamos partir para tentar remediar todo um passado de erros, porque há muito para ser feito, não somente na iluminação pública. Temos pressa, porque a política é muito volátil e porque o fulgor desnecessário que vemos estampado no céu noturno continua crescendo rapidamente por causa de inúmeros projetos residenciais, institucionais e comerciais que não levam o meio ambiente em consideração. É tarefa para muitos anos e que deve ser realizada com a colaboração de toda a população, principalmente dos milhares de crianças e jovens de hoje, que me conhecem pessoalmente e a quem sempre doei meu trabalho e meu tempo, no intuito de despertá-los para a compreensão de seu lugar no Universo e para uma apreciação mais abrangente da Natureza.