A proposta e a dura realidade


Compreender a poluição luminosa não exige muito esforço. É suficiente olhar para a iluminação artificial noturna de nossas cidades para comprovar o enorme desperdício causado pela emissão de luz em todas as direções. O simples fato de vermos diretamente as lâmpadas acesas à distância nos mostra a dispersão, pois essa visão somente é possível quando recebemos raios de luz que partem daquelas lâmpadas até nossos olhos. E se estes estão vindo em nossa direção, não estão iluminando as áreas próximas às fontes de luz, que seria seu único propósito.

Uma vez constatado que o problema tem uma causa muito simples, a solução passa a ser imediata: utilizar somente luminárias eficientes, não dispersivas, que aproveitem toda a luz gerada pelas lâmpadas que elas abrigam. E uma boa razão para se fazer isto é que, no caso da iluminação pública, a poluição luminosa é também um flagrante desperdício de dinheiro público, sem falar no gasto extra de energia elétrica que é exigido para criar uma luz que não vai ser utilizada.

Há ainda um aspecto agravante: a luz desperdiçada, pela qual pagamos e depois jogamos fora, causa uma interferência desnecessária no meio ambiente, facilmente verificável pela existência daquelas bolhas de luz que cobrem nossas grandes cidades. O excesso de luz lateral também nos incomoda, pois penetra em nossas residências sem o nosso consentimento, nos tira o sono ou nos ofusca quando dirigimos nas estradas e vias urbanas. Atingindo nossos olhos, essa luz fecha nossas pupilas e diminui nossa capacidade de enxergar.

O prejuízo para a Ciência é incalculável. A luz desperdiçada e inútil, dirigida para cima sem nenhuma necessidade, produz um véu opaco para uma outra luz que nos traz preciosas informações sobre o passado remoto do Universo. Esta vem das profundezas do espaço cósmico, viajando milhares, milhões ou mesmo bilhões de anos até nós, para ser desprezada ao final de sua longa jornada pela insensibilidade dos que não percebem sua importância. Assim, nos sonegam aquela magnífica imagem que está lá para mostrar que somos muito mais do que supomos e que há muito mais para ser experimentado além da vida de trabalho duro a que a grande maioria de nós é obrigada a se submeter, apenas pela sobrevivência.

Quando iniciei esta campanha, em 1992, solicitando uma melhor qualidade para a iluminação noturna, pensei ser fácil convencer a todos de sua importância, já que havia também um fator econômico envolvido no processo. Entretanto, nos últimos seis anos, pude perceber que, com raríssimas mas ainda infrutíferas exceções, ninguém parece preocupado com isso. Ouvimos falar em coisas bonitas como a participação de todos na construção de uma grande cidade, mas a verdade é que se você questiona alguma coisa, mesmo com a melhor das intenções, você é quase excomungado. Ninguém quer sua colaboração. E ser ignorado não é fácil, ainda mais quando se sabe que o futuro de muitas crianças criativas e inteligentes está sendo ameaçado.

Sabendo ser cara a substituição de todas as luminárias instaladas na cidade, minha proposta básica, a curtíssimo prazo, sempre foi a da iluminação correta para as novas áreas. Isto evitaria o agravamento da poluição luminosa. A segunda etapa, de início também imediato, mas que poderia durar décadas, seria a substituição das luminárias antigas, dispersivas, apenas pelas corretas, quando houvesse necessidade pelo fim da vida útil, vandalismo, acidentes, etc. Se fosse algo absurdo, não estaria sendo feito em várias cidades do Primeiro Mundo. Entretanto, o que ocorre aqui em Uberlândia é a utilização de luminárias dispersivas nos novos projetos de iluminação, muitas vezes com lâmpadas de sódio de brilho forte. Há casos de avenidas de duas pistas, ligando nada a lugar nenhum, sem asfalto nem casas, mas já utilizando luminárias de globo de vidro com lâmpadas fortes. Ocorre também a substituição simples das lâmpadas de mercúrio pelas de sódio em luminárias inadequadas e, pior ainda, a substituição completa de luminárias antigas, às vezes até mesmo das corretas, por outras mais dispersivas e também dotadas de lâmpadas muito luminosas. A degradação do céu vem aumentando rapidamente nos últimos anos, sendo possível observar isso nas nuvens noturnas, que assumiram a cor amarela da nova lâmpada. É o nosso dinheiro indo diretamente para o espaço em plena época do racionamento de energia.

Construí um observatório astronômico que vem sendo utilizado na educação de inúmeras pessoas que o visitam. Eu o fiz porque sabia quanto tempo seria necessário para convencer algumas pessoas da necessidade e importância de um observatório municipal, como existe em vários locais do País, mesmo em pequenas cidades. Outros mais devem ser construídos aqui, também pela iniciativa privada, oferecendo, principalmente às crianças e jovens, uma opção bem mais saudável do que aderir à baixaria, à violência e à degradação social que ocorrem à nossa volta, que alguns até dizem não existir.

Estamos contribuindo para o desenvolvimento científico de nossa cidade. A única participação que solicitamos é que aqui respeitem o meio ambiente, que não inviabilizem o nosso projeto e que nos permitam trabalhar em paz por um futuro melhor para todos.


Roberto F. Silvestre
30 de setembro de 1998



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